sexta-feira, 15 de maio de 2015

Novas “vozes” da música brasileira - Antonio Loureiro


por Caio Garrido

Onde estão as vozes, músicos e artistas que estariam traçando os caminhos daquilo que seria a música contemporânea brasileira?

Foi tentando responder a essa pergunta que buscamos conhecer um pouco da trajetória do compositor e multi-instrumentista Antonio Loureiro.

Passeando entre a canção e a música instrumental, Loureiro é um dos exemplos mais vivazes e bem vindos da música brasileira atual. Inspirado por sua herança musical, vinda dos contornos regionais dos montes de Minas e outras cercanias, Loureiro inspira seus ouvintes com seu talento e habilidade a serviço da música, potencializando a música instrumental e não a deixando estéril.

Com dois discos solo já lançados, Loureiro traz em sua caixa de sonoridades toda a mistura que o caracteriza: os acentos regionais, a influência do jazz contemporâneo, da cultura popular brasileira, entre outros. Neles, apresenta um esmero no cuidado com a produção e com os detalhes, em cada nota e timbre, potencializando as harmonias em suas contiguidades. Seu último álbum solo tem o sugestivo nome “Só”, que traz diversas participações especiais, como a de Siba, Tatiana Parra, Frederico Heliodoro e outros grandes parceiros, que sempre o deixam bem acompanhado.


- Antonio, nos fale um pouco sobre sua história na música. Minas Gerais influenciou sua música? E o Clube da Esquina?

Cresci e vivi até os 24 anos em Belo Horizonte. Meu pai é clarinetista professor da UFMG e minha mãe musicoterapeuta também professora na mesma escola. Tocava piano muito bem quando pequeno mas desisti porque ganhei uma bateria. E foi através desse instrumento que comecei meu caminho na música. Adorava o Michael Jackson. Ouvi muito rock de todo tipo. Gostava do Sepultura, Soundgarden, Nirvana e várias outras do rock e do metal feito na época. Adorava o Yes, o Genesis, o Pink Floyd, Hendrix, por causa do meu pai e dos amigos mais velhos... Ali eu percebi que existia uma conexão com vários outros aspectos musicais que não somente o rock. Que esses gênios da música tinham influência de muita coisa. Depois de um certo tempo a música eletrônica me marcou também. Ia muito às festas e gostava de fazer essa música no computador. Convivi com muitas possibilidades musicais sem preconceito e curtindo muito a infância, adolescência e juventude. Sempre tive muitos amigos bem mais velhos do que eu. Uma pessoa que me apresentou muita música foi o Pedro Trigo, grande baixista, amigo mais antigo que tenho. Tocamos juntos em banda de rock e até hoje dividimos palcos em vários sons diferentes. Sempre tive alguma noção de como era viver de música e da real necessidade de se estudar música. E adorava estudar muito meu instrumento. Tocar bem! E nesse período, entre 12 e 17 anos de idade, participei de vários festivais de música, fazendo aulas de instrumento e vivendo experiências de banda sinfônica, big band, grupos de percussão e coisas do tipo (Em Tatuí, Campos do Jordão, Diamantina, Ouro Preto, Curitiba; todas essas cidades que sediavam os festivais). Em meio a isso tudo eu tocava, tanto nas bandas cover de rock, quanto na noite com músicos da cena instrumental. Comecei a tocar alguma coisa de jazz e bossa nova instrumental com 11 anos de idade com o Paulão Lacerda, falecido amigo trombonista professor da UFMG e por isso muito amigo da família e do meu pai. Eu ia ver meu professor tocar muito!! E ele, depois de ver que eu adquiri ali uma certa experiência na bateria, me botava pra dar uma “canja”. A partir de um momento, toda vez que eu ia ver ele eu dava essa canja que na verdade era uma super mega escola pra mim. Esse mestre foi o Limão.
Foi ele quem me inseriu na cena da música instrumental de BH. Eu o substituía muito em um certo período. Quando eu tinha de 14 a 16 anos de idade acho... Isso me fez tocar com a maioria dos músicos da música  instrumental de Belo Horizonte. Só quando entrei na universidade que comecei a conviver e tocar com um pessoal mais perto da minha idade e que fazia "outros sons": Rafael Martini, Kristoff Silva, Felipe José e Frederico Heliodoro; que marcaram essa época. Quando me perguntam sobre o Clube da Esquina eu sempre digo que comecei a ouvir mesmo e conhecer mais, não só o Clube, mas tudo que conheço de música brasileira, mais tarde, a partir dos 16. Ao mesmo tempo eu estava sempre tocando esses sons na noite. Em BH é comum ver um grupo instrumental tocando versões do Milton, do Toninho Horta. Mas não conhecia desde pequeno. Fui entender a importância de Elis, Milton, Gil, Caetano e essas figuras todas da MPB mais tarde. Entendi mais ainda quando acompanhei o Toninho Horta e percebi a importância dele na história da música brasileira. O jeito dele fazer música me inspira muito. É livre, é canção, mas não é... Não importa...

- Como você vê hoje a música brasileira? Porque é tão difícil, compositores e artistas como você alcançarem uma melhor notoriedade, tão diferente da época dos festivais nos anos 60, em que num mesmo período de tempo surgiam artistas de real qualidade da MPB para o grande público? Como você acha que se posiciona neste cenário hoje?

Basta você comparar os festivais de televisão dessa época e os de hoje. Ao mesmo tempo eu não vou por esse caminho da comparação de épocas pra se pensar estética, produção musical e formas de consumo de arte e cultura. São muitos os fatores que fizeram e fazem a diversidade e qualidade caírem nos grandes meios de comunicação. Além de fazermos parte da era da imagem... Tudo é imagem!  Não sou a melhor pessoa pra esclarecer sobre as mutações do mercado fonográfico, mas eu entendo que se transformou muito e acho que tem cada vez mais dinheiro envolvido. E acho muito difícil equilibrar a sensibilidade e força para a arte, com a técnica e talento para se fazer dinheiro.  Ou seja, a meu ver, quanto mais dinheiro envolvido, menos arte, pois o objetivo final é o lucro e não o enriquecimento cultural de um público, de um povo. Hoje tem muita coisa boa sendo feita no Brasil. Não se pode dizer o contrário. Não sou e nunca serei o velho reclamão que coloca a música independente e a produção atual no fracasso, no lixo. O Brasil é enorme e não dá conta do tanto de coisa sendo feita. Fato. Temos então que continuar fazendo algo que acreditamos: mexer com a sensibilidade das pessoas, independente da notoriedade ou público que isso traga para o artista. Faço com amor para o público, mas conquistá-lo não é meu objetivo. Meu objetivo é passar uma mensagem, um sentimento, uma ideia, um momento, mexer com o corpo, a dança, um conhecimento, uma reflexão, uma sensação (boa ou ruim); Trabalhar o sensorial e imprimir algo na memória. E é a partir daí que vai se formar o público que vai ouvir o que faço. Não me importando se são milhões ou dezenas de pessoas. No mercado não funciona assim; Se você ouve o que o mercado te vende, na rádio, TV, tudo aquilo é 50 vezes mais "fácil, extremamente fácil", justamente pra entrar no seu cérebro e não sair nunca mais! Eu não estou a fim de invadir o cérebro de ninguém... Deus me livre! Música boa, bem feita, genial, com grandes artistas, surge hoje assim como surgiam antigamente. Só não estão na TV, rádio, ou jornal, a toda hora. Quem está na grande mídia, paga para estar ali e precisa dela para movimentar um negócio. Mas existe a internet e na internet tem espaço pra todos... Ainda... A gente tem que trabalhar com o que tem e se encaixar e abrir os espaços possíveis, com a força e as possibilidades que temos. 


No mercado não funciona assim; Se você ouve o que o mercado te vende, na rádio, TV, tudo aquilo é 50 vezes mais "fácil, extremamente fácil", justamente pra entrar no seu cérebro e não sair nunca mais! Eu não estou a fim de invadir o cérebro de ninguém... Deus me livre!



- Você começou na bateria e na percussão, certo? Você transcendeu a bateria tocando outros instrumentos? O tocar outros instrumentos te deu a possibilidade de olhar e tocar a bateria e percussão de outro modo? Como você se enxerga como músico?

Sim. A bateria tem suas características técnicas e suas linguagens. Levo isso para os outros instrumentos que toco. Tenho mais experiência, técnica e intimidade com a bateria. Mas tocar outros instrumentos e aprender vários outros, me ajuda na produção musical, nos arranjos, na composição e na comunicação com os músicos que trabalho.

- Grande parte de seu CD “Só” foi gravado por você tocando todos os instrumentos. Como é encarar o processo de produção e gravação desta forma?

É uma outra forma apenas. É mais fácil por um lado, porque eu simplesmente gravo uma ideia que já foi formada no arranjo e tiro um som que já está preconcebido. Organizo tudo em blocos e mais blocos de anotação e esboços de arranjo. Por outro lado é difícil, pois não tem um produtor escutando e dizendo se está bom ou ruim aquele take gravado. Então leva mais tempo para amadurecer a ideia e ouvir distanciado do ambiente de intérprete. Trabalhar dessa forma exige que você separe bem o trabalho que você faz como intérprete do trabalho de produtor do disco. O inseparável é justamente o que dá o resultado desse trabalho.




... quanto mais dinheiro envolvido, menos arte, pois o objetivo final é o lucro e não o enriquecimento cultural de um público, um povo. Hoje tem muita coisa boa sendo feita no Brasil. Não se pode dizer o contrário. O Brasil é enorme e não dá conta do tanto de coisa sendo feita. Temos então que continuar fazendo algo que acreditamos: mexer com a sensibilidade das pessoas, independente da notoriedade ou público que isso traga para o artista. Faço com amor para o público, mas conquistá-lo não é meu objetivo.



- Você canta, toca, compõe, e passeia entre a música instrumental e a canção. Quais as dificuldades que encontrou nesse processo? 

Mais natural impossível. Gosto do instrumental e da canção, assim como gosto do doce e do salgado. Às vezes o doce antes, às vezes misturado... Assim como gosto da pintura e do cinema. Enfim, gosto da mistura (em doses diferentes), das características em separado, do clássico, do contemporâneo. Tudo inspira. Não tenho as características de um especialista. Sou menos focado. Disperso e feliz por isso.








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Entrevista realizada simultaneamente para o blog M
úsica Contemporânea  e para a 2. Edição da Revista Tavola Magazine–


Para acompanhar a música “Luz da Terra” do disco “Só”, acesse:

sábado, 4 de abril de 2015

Chet Faker | Fake só no nome - Potencial e Personalidade

O estilo é outro. O instrumento e a voz também. Mas mesmo assim, tudo em Chet Faker  não só a alcunha que lhe dá o nome artístico – lembra o outro semelhante, o original: Chet Baker.
Sua impostação de voz, a sutileza com que toca seu Rhodes, e suas simples e belas composições, fazem jus a sua influência jazzística maior, apesar das diferenças de gênero musical.


 Vale a pena dar uma conferida neste som aqui, diferente da versão originária:
https://www.youtube.com/watch?v=z8Wjdss5uMg
 - Talk is Cheap -  para ouvir mais de 2 vezes


quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Michel Leme – 9



Continuamente inovando na forma de praticar música, improvisar e gravar, juntando tudo isso como uma forma de expressão singular, Michel Leme vem com um novo disco, revigorando a música instrumental novamente.

Algumas faixas de seu cd intitulado “9” estão no vídeo abaixo:


Segundo Michel, o nome do disco é por ser seu nono lançamento oficial. Mas as sincronicidades da vida apontam para outros significados também. Segundo ele ainda, na numerologia, dizem que este é o número da inspiração. Caiu como uma luva.


A produção do cd está impecável. Qualidade pra nos surpreender, pois foi gravado numa tarde, sendo metade do disco no primeiro take e a outra no segundo. Com um reverb totalmente natural, Michel diz que foi muito bom gravar numa sala tão grande e viva como esta. Aliás, o som da bateria é algo que se destaca diante de recursos simplificados. Ficou incrível. 

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Grooves cinematográficos



A bateria está com todo prestígio atualmente: Dois grandes filmes presentes nas indicações de melhor filme para o Oscar 2015 contaram com a bateria no plano principal ou secundário das cenas e trilhas sonoras.

No filme Whiplash: Em Busca da Perfeição, o personagem principal é um baterista que sonha em ser o melhor e marcar o seu nome na música, tal como Buddy Rich e outros grandes do instrumento. Ele é aluno de um sádico professor, que acredita em velhas preconcepções e chavões que aparecem literalmente ou subliminarmente no filme, como: "Baterista não é músico", ou quando no filme o professor justifica suas ações dizendo que Charlie Parker só se tornou quem ele era, pois levou uma "pratada" na cabeça, e que aquele era um método efetivo para se buscar um verdadeiro talento, puxando-o até o extremo limite.

Independente disso e por isso também, o filme é uma pérola para os músicos e não músicos. Mostrou como poucos a grande beleza e dificuldade que é tocar esse instrumento único.

Para corroborar isso que estou dizendo, muitos dos grandes bateristas em atividade vem falando sobre o filme, como Mike Portnoy​, ex-baterista do Dream Theater, que postou em sua página do facebook: "Watched ‪#‎Whiplash‬ again for the 2nd time, blown away again! Best drumming film EVER made! Watch this -->
 https://www.youtube.com/watch?v=dF3NAlZuYmI&feature=youtu.be
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Além de "Whiplash", Birdman, também concorrente ao Oscar de melhor filme, se destaca pela trilha sonora realizada pelo grande baterista Antonio Sánchez, que ficou de fora da lista de pré-indicados ao Oscar 2015 para Trilha Sonora.
Durante a película, um som de bateria permeia as cenas, sendo um dos principais diferenciais do filme.
O diretor Alejandro Iñárritu diz que acha que houve preconceito contra o trabalho prioritariamente percussivo de Sanchez:

"A bateria é, para mim, a batida do coração dos atores. Eu acho que a bateria é um instrumento que não foi muito explorado no cinema. Acho ela tão eficiente quanto a guitarra ou o piano", avaliou o diretor. O cineasta não poupou críticas ao parecer da Academia sobre o assunto. "É uma decisão injusta. É óbvio que a trilha sonora de Antonio representa mais 50% das músicas usadas no filme [um dos critérios para ser elegível]. Isso é um fato. Eu sei que há muito preconceito quando se debate se a bateria tem ou não melodia. Este cara [Antonio Sanchez] estudou música por sete anos em Berklee [uma das melhores, senão a melhor, faculdade de música do mundo]. Ele é um baterista profissional há 30 anos", defendeu Iñárritu. "O filme não seria o mesmo sem a bateria de Antonio. Não considerar isso é dizer 'a bateria não é importante, nós não consideramos isso uma composição musical'. Se eles realmente desclassificarem a trilha sonora será um grande erro. Será escandaloso", afirmou o diretor. (Ouça parte da trilha sonora do filme abaixo)