sábado, 18 de junho de 2011

Patrick Laplan e Eskimo - Uma nova maneira de ser do pop


Patrick Laplan, multi-instrumentista, produtor e compositor, acaba de lançar seu mais novo projeto: Eskimo. Além de ter tocado no grupo Los Hermanos, atuou como baixista do Biquini Cavadão por um bom tempo. Desde 2010 assumiu as baquetas na gravação do primeiro cd do Eskimo (Felicidade Interna Bruta), revelando uma faceta pouco conhecida para o grande público. Além de uma intensa criatividade, Patrick explora neste projeto todas as possibilidades de se experimentar com a música pop, usando atributos rítmicos de outros estilos musicais para compor uma obra extremamente original e singular. A bateria, não por acaso, é um dos principais destaques e ingredientes das músicas.


-- Nos conte um pouco de sua trajetória na música e em cada um dos instrumentos. O que veio primeiro, a bateria ou o contrabaixo?




A bateria. Aos onze, doze anos, migrei do videogame para a música. Aos treze, ganhei uma assustadora Roll Star. Hoje, certamente teria bom uso. O contrabaixo só viria uns cinco, seis anos depois, quando me chamaram pra tocar no Los Hermanos, e quando comecei a estudar com o Nico Assumpção. Mas nunca deixei de praticar bateria.





-- Quais fatores mais pesaram para motivar sua saída do Los Hermanos?



Ahh, a pergunta de 1 milhão de dólares…



-- Suas ideias e composições eram bem aceitas pelo grupo?





Eu ainda não era compositor na época. Quanto à ideias e arranjos, sim. O processo sempre foi muito aberto e democrático.




-- Como foi o processo de amadurecimento da ideia do que hoje se tornaram as músicas e o projeto do Eskimo? Desde quando vem sendo gestado o projeto?



Tão longo que os conceitos virariam de cabeça para baixo várias vezes. A gestação não foi do projeto, e sim da pessoa, de uma personalidade. E certamente houve muita insegurança minha em terminar o que seria o objeto que finalmente me definiria, pelo menos inicialmente. Agora eu acredito que alguém pode ouvir o disco e dizer que entendeu quem eu sou. Antes disso teve muita coisa da qual me orgulho muito, mas que não dizia tanto de mim. Não quero dizer que o F.I.B. (Felicidade Interna Bruta) disse tudo de mim, mas tudo o que foi dito, foi dito por mim. E ainda tem muita coisa a ser dita. O Eskimo começou calcado em colagens abruptas (a la Mr.Bungle e Beck), climas soturnos, com um quê minimalista, "brinquedinho". Por isso o Tim Burton com seu universo "Noiva Cadáver" sempre foi citado como referência. E com o tempo, fui deixando as letras e composições dominarem o conceito e se completarem naturalmente, instintivamente. Elas estariam amarradas pelo fato de terem brotado da mesma cabeça. A gravação começou no dia 2 de julho de 2009, e terminou em 30 de agosto de 2010. Parece muito tempo, mas para um disco praticamente feito em casa, por mim e meus amigos, não acho tanto. O processo todo está no diário de bordo do nosso site. É fácil de ver a paciência que eu tinha para descrever tudo no começo, e como o texto se torna mais monossilábico no final, de tão cansativo que foi.

-- Como foi tocar bateria neste disco? Foi algo que você sempre almejou, ou o baixo sempre foi o instrumento para o qual você se dedicou e se propôs a gravar e tocar?




Maravilhosamente tenso. Imagine um baterista conhecido como baixista, que nunca teve a oportunidade devida de gravar? Era uma coisa que eu devia pra mim mesmo, e foi essa sede que levei para gravar. Se fosse para ilustrar, eu diria que o baterista Patrick (nesse disco) foi o músico menos maduro dos Patrick´s. O produtor Patrick e os outros músicos Patrick´s meio que seguraram a onda para essa "criança" poder soltar os bichos. E só dessa maneira pode haver coesão. Essa explosão não deixa de ter sua beleza, e por isso eu permiti que isso acontecesse. Não estou dizendo que as baterias do disco são imaturas, mas comparativamente foram. (Que confusão de Patrick´s. Falar de mim na terceira pessoa é imperdoável). E foi tenso porque 95% dos arranjos de bateria foram memorizados nota por nota, e eram muitas as variações, viradas e detalhes, que fariam toda a diferença. E eu sabia que não me perdoaria se eu esquecesse alguma coisa. Exigiu muito do "HD interno". Viva a auto-sabotagem, a quebra de limites, e o auto terrorismo.

-- Você consideraria a sua bateria como um dos principais meios de interlocução para a composição das músicas do Eskimo?



Não. Com exceção de "À Deriva", que foi muito calcada na bateria, a idéia sempre foi ter todos os elementos brilhando ao mesmo tempo. Melodia e letra não tiveram prioridade com relação aos arranjos. Sempre tentei fazer com que todos os elementos pudessem estar funcionando no máximo de seu potencial em 100% do tempo.



-- Cada música do álbum traz seu próprio desdobramento musical, criando uma árvore genealógica de ritmos e sons possíveis. As influências foram importantes nesse processo, ou foi mais um libertar das influências estéticas musicais?



As influências afloram naturalmente. Não foi racional ou conceitual. Se você parar pra pensar nelas, é um passo pro plágio. É uma questão de fechar os olhos e se deixar levar. Registrar o resultado, e aprimorá-lo. Ou descartá-lo, e tentar de novo. Tudo que você viveu e ouviu a vida inteira acaba saindo pelos poros, quer você queira ou não. Então melhor nem pensar sobre isso. Faça mais, e deixe pros outros pensarem sobre o que você fez.

-- Como você costuma compor? Como se caracterizou a composição das músicas no Eskimo?



Não tem regra. Umas começam pela letra, outras pela melodia. Às vezes por um arranjo, um riff, uma batida... Tanto faz o instrumento. Tocar uma coisa que você não domina pode ser bom nesse caso. Você não tem a tendência instintiva de seguir um caminho que já conhece. Abre espaço para o inesperado.



-- Como foi e é a oportunidade de trabalhar como produtor, tocar baixo, guitarra, bateria, piano, organizar arranjos, etc.? Como é ter toda essa visão panorâmica, podendo ser a autoridade do próprio trabalho?



Foi um fardo. Literalmente. Muita responsabilidade, e poucos ombros pra dividir o peso. Achei que todo o processo seria muito prazeroso, mas não foi. Foi cansativo, demandou demais. Dividir é sempre bom. Inclusive as alegrias. Não foi uma opção pelo poder em termos de ego, e sim pela estética. Ninguém conseguirá swingar com você tão bem quanto você mesmo. Agora imagine uma banda inteira respirando totalmente junta? Como um só? Era essa a idéia. E acho que valeu a pena. Consegui o resultado que queria, mas não sei se teria gás pra fazer isso de novo. Deve ser como pular de moto de um prédio pra outro. Só depois que você faz, que tem ideia da "m...." que fez. E diz: "Nossa. Fiz uma parada muito maneira. Mas... Nossa! Como sou um imbecil de ter me jogado desse prédio". Como produtor, foi um dos poucos ângulos que valeu a pena. (novamente o caso dos mil Patrick´s). Você tem noção exata de todos os "pingos dos i´s" do disco. Facilita muito pra poder amarrar as ideias ou levá-las a extremos.

-- Quais foram e são suas principais influências na bateria?



A gente vai crescendo e mudando. Quando mais novo, eu gostava muito do Dave Abbruzzese, do Tim Alexander, Fish Fisher, Sim Cain e do Igor Cavalera. Os favoritos de hoje em dia são Matt Chamberlain, James Gadson, Rafael Barata, Jojo Mayer, Chris "Daddy" Dave, Abe Laboriel Jr., Chris Pennie, Homer Steinweiss, Deantoni Parks, Nate Smith, Pupilo, Jack Irons, Duda, Rafael Rocha, e as programações absurdas do Squarepusher.



-- Somar referências e influências nem sempre traz um bom resultado para quem deseja buscar um novo som. A ordem dos ritmos altera o resultado?



Muita gente tem medo de estudar por causa disso. Tem medo de aprender as regras e bitolar nelas. Informação não atrapalha. Conhecer as regras facilita você a quebrá-las. Imite. Assimile. Inove.



-- Você acha que a música pop hoje em dia ainda tem dificuldade de assimilar o pitoresco, a singularidade?



Acho a nova geração do pop preguiçosa e desrespeitosa. Não faz questão de pesquisar as raízes do que gosta, e não tem dor na consciência de copiar descaradamente, contanto que ninguém descubra. Isso em geral, porque existem poucas e boas exceções. Talvez por isso o alternativo/experimental dessa geração acaba sendo muito mais interessante. Com o passar de gerações é mais trabalhoso ser original. Os caminhos já foram explorados. Fica difícil chegar com uma super novidade. Mas é dever do artista tentar. Você não pode se sentir pleno usando uma frase feita de alguém. E a beleza está em deixar esse "seu" ir à tona, mesmo que pequeno. É o que me faz respeitar e gostar de um artista. Estar aberto à possibilidade de ser visto de verdade.



-- Como é a questão da relação baixo/bateria para você, já que consegue percorrer os dois caminhos com fluência?



Facilita muito. É ter o conhecimento absoluto do que a outra parte está tocando, de como ela respira e flexiona o tempo. Fica muito confortável pra criar uma unidade. É preciso ter cuidado pra não cobrar uma conexão tão grande quando se toca com qualquer outra pessoa. Você aprende a valorizar mais as diferenças.

-- E como serão os shows, você vai tocar bateria, baixo, outros instrumentos, ou um pouco de cada?

Seria difícil escolher, mas as circunstâncias facilitam. A princípio eu tocarei baixo apenas. Gostaria de ter a opção de trocar em certas músicas, mas pra isso precisaríamos de alguém com mais experiência no baixo. Todo mundo toca mais de um instrumento, mas o baixo é limitado. Temos Diego Laje na bateria e percussão, Dudu "Quindim" Miguens na guitarra, violão e percussão, Fabrizio Iorio no piano e acordeon, e Cauê Nardi na voz, violão e cavaquinho. Esse é o Eskimo em shows.

-- Para verdadeiramente nadar na música, é preciso saber se afogar às vezes?

Não acho preciso não, mas toda experiência traz conteúdo. E certamente é melhor morrer tentando, do que ficar de boinha no rasinho.